Da desumanização ao Produto Humano
- Lucas Ramos
- 17 de dez. de 2017
- 3 min de leitura

Uma obra de ficção que me tocou bastante e que me fez pensar sobre certas coisas é o livro "O Planeta dos Macacos" de Pierre Boulle, apesar da obra ter mais de 50 anos ela traz uma reflexão um tanto atual, tem sua carga sobre a industria da caça e dos maus tratos aos animais, mas o ponto que me chamou atenção, não tão diretamente como os outros, mas não menos importante foi a desumanização do ser humano e a sua transformação em um produto de comercialização e consumo.
Vivemos rodeados de propagandas e modelos que devemos obedecer, o ser humano moderno é definido pelo ato de consumir, não mais importa intelecto ou ser bípede, o homem só é homem quando consome, a mulher só é mulher quando consome, quando se adequam ao que a grande máquina social lhe diz ser o correto, tudo é rotulado, tudo e todos são enquadrados em um modelo, em um grupo, onde se deve ter opiniões e lados em tudo, e caso sua opinião não seja coerente com a do grupo no qual foi enquadrado tu és tomado como insignificante.
O corpo se tornou um veículo de propaganda e as pessoas superficiais como se fossem embalagens, tão trabalhadas e perfeitas por fora, porém o conteúdo é escasso e de baixa qualidade, que muitas vezes pode fazer mal à saúde, mas no mercado não se trata de quem tem o melhor produto, mas sim quem melhor sabe vender e enfatizar visualmente aquilo.
As relações interpessoais são agora previamente construídas por meio da tecnologia, as pessoas escolhem seus círculos sociais ou relacionamentos amorosos da mesma forma como escolhem seus pedidos em redes de Fast food, baseado em seus gostos, limitando a variedade de interações que poderiam absorver, buscam outros com a mesmas opiniões e estilos de vida, se fechando em uma bolha, reafirmando cada vez mais sua ignorância sobre certas coisas.
Inconscientemente todos nós somos escravos das aparências, buscamos nos adequar, queremos atenção, então consumimos, nós produzimos, tudo em busca de um status, de uma autossatisfação ao ser aceito e admirado pelos outros como se nossa felicidade dependesse do que eles acham ou deixam de achar, assim como um departamento de marketing tentando vender um novo produto, nós vendemos o que não somos para pessoas que não nos importamos para simplesmente sermos "alguém".
Se buscamos ser o que não somos para ser algo, o que somos nós?
O sentimento, por sua vez, se tornou, de certa forma, sintético. Não mais sentimos de verdade, apenas parecemos que sentimos e dizemos estar sentindo mesmo antes de realmente sentir. Os sentimentos são colocados como palavras de um dicionario, sabemos o que é aquilo pelo fato de nos terem informado, assim como nos foi dito que uma bola é uma bola e assim sabemos definir o que é a bola, porém não quer dizer que já tenhamos pego uma bola, sabemos porque aprendemos, não porque conhecemos.
A essência de ser humano se perdeu, estamos dispostos na prateleira da vida como produtos padronizados se diferenciando somente pela marca que nos veste, esquecendo quem nós somos, o que nós somos e o que realmente são as coisas, se confundindo com o significado dos sentimentos e dando valor para vidas virtuais, lugares onde somos reis de nada, sendo quem não somos. Vivemos num caçada de nós mesmos, abatendo aqueles que dizemos ser todos iguais.
"três renques de cadáveres cuidadosamente dispostos, homens e mulheres alternados, estas dardejando um linha de seios dourados em direção ao astro monstruoso que incendiava o céu. Desviando os olhos com horror, percebi a chegada de um tripé. Era um chimpanzé. Reconheci prontamente nele o fotógrafo que deveria registrar a lembrança das proezas cinegéticas para a posterioridade símia. A sessão durou mais de quinze minutos, os gorilas primeiro sendo fotografados individualmente em poses fanfarronas, alguns apoiando o pé com uma ar de triunfo sobre uma de suas vítimas, depois em grupo compacto, cada um passando o braço no pescoço do vizinho. Foi então a vez das macacas, que posaram graciosamente diante daquela carniça, com seus chapéus emplumados bem à vista. Esta cena comportava um horror desproporcional à resistência de um cérebro normal..."
Tal acontecimento é de um horror descomunal para a personagem, mas na realidade em que vivemos, não estaríamos nós fazendo o papel dos gorilas? Tirando fotografias de nosso povo à beira da morte, fazendo nossos semelhantes de escravos e tirando a humanidade e a dignidade deles, colocando-os em fila, filas de corpos, filas de escravos, filas de consumidores.
Quem você é nessa historia?
Um gorila, um chimpanzé ou um humano?
Mas qual é o mais animal?
O homem ou o bicho?
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